Entre 2011 e 2023, o número de licenças na construção registou uma tendência decrescente, refletindo transformações económicas, demográficas e urbanísticas. Esta evolução teve impacto direto não só no volume de novas construções, mas também nas características dos edifícios e das habitações, bem como na distribuição geográfica da atividade construtiva.
Queda no licenciamento de obras
Durante este período, a dinâmica construtiva potencial, medida pelo número de fogos licenciados em relação ao total existente em 2011, foi de apenas 5,4%. A maioria das regiões do país contribuiu para a diminuição do licenciamento, com taxas médias de crescimento anual negativas tanto para edifícios como para pisos. Apenas algumas exceções, como a Península de Setúbal, a Grande Lisboa e a Região Autónoma da Madeira, registaram crescimentos positivos no licenciamento, contrariando a tendência nacional.
Esta quebra no licenciamento de obras reflete-se na redução do número de edifícios e de pisos licenciados, o que se traduziu numa menor oferta de novas habitações no mercado. A construção nova manteve-se como o tipo de obra mais frequentemente licenciada, exceto entre 2012 e 2014, período em que a reabilitação e reconstrução de edifícios ultrapassou o licenciamento para novas construções.
Casas e edifícios mais pequenos
Outra tendência evidente ao longo desta década foi a diminuição da dimensão média dos edifícios e das habitações. A construção em altura sofreu uma ligeira redução, passando de uma média de 1,8 pisos por edifício em 2011 para 1,7 pisos em 2023. No que diz respeito às habitações, as tipologias T3 ou superiores, que dominavam o mercado, passaram a ter uma média de 4,1 divisões por fogo licenciado em 2023, abaixo das 4,6 divisões registadas em 2011.
Este fenómeno traduz-se numa maior concentração de casas mais pequenas, adaptando-se à procura de segmentos como jovens, investidores e famílias mais pequenas. Ao mesmo tempo, verifica-se uma tendência para construir mais fogos por edifício, procurando rentabilizar o investimento e responder à pressão do mercado imobiliário, sobretudo nas zonas urbanas.
Pressão construtiva assimétrica
O licenciamento de obras em Portugal evidenciou fortes assimetrias regionais. As zonas litorais e metropolitanas, como a Área Metropolitana do Porto, a Grande Lisboa e o Cávado, concentraram a maior pressão construtiva, tanto em área construída como em altura. Estas regiões registaram também um crescimento populacional mais acentuado, o que impulsionou a necessidade de novas habitações.
Em contraste, o interior do país e as áreas menos densas registaram uma expressão muito menor no licenciamento de obras. Esta disparidade territorial acentua as dificuldades de fixação de população em zonas rurais e menos desenvolvidas, agravando o desequilíbrio entre litoral e interior.
Reabilitação urbana com menor expressão
Apesar de se ter verificado um aumento da reabilitação urbana entre 2012 e 2014, este tipo de obra nunca ultrapassou os 5% da área licenciada em relação à construção nova durante o período em análise. Após um pico em 2014, a tendência foi de diminuição gradual, culminando em apenas 1,6% em 2023. Isto demonstra que, apesar do discurso político e das necessidades de regeneração urbana, a construção nova continuou a dominar o setor.
Desafios futuros para o licenciamento na construção
A redução das licenças na construção coloca desafios importantes para o futuro do setor em Portugal. A escassez de nova oferta habitacional, aliada ao aumento da procura nas cidades, contribui para a subida dos preços e dificulta o acesso à habitação, especialmente para os mais jovens. Por outro lado, a diminuição do tamanho das casas pode não responder às necessidades de todas as famílias, criando novas pressões sociais.
A concentração da atividade construtiva nas zonas metropolitanas e litorais reforça o desafio do desenvolvimento equilibrado do território, exigindo políticas públicas que incentivem a construção e a reabilitação no interior do país. O licenciamento de obras continuará a ser um barómetro fundamental para avaliar a dinâmica do setor e a capacidade de resposta às necessidades habitacionais dos portugueses.
As licenças na construção em Portugal diminuíram na última década, com impacto na dimensão dos edifícios e das casas, e com uma pressão construtiva muito desigual entre regiões. O futuro do setor dependerá da capacidade de adaptar o licenciamento às novas realidades demográficas, económicas e territoriais, promovendo uma construção mais equilibrada, sustentável e inclusiva.
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